Fear this queer

Escrevo esse texto no dia 7 de setembro de 2019, muito mais do que o dia em que se comemora a independência do Brasil hoje também é o dia depois de uma grotesca tentativa de censura de conteúdo LGBT. Para resumir a opera: durante a Bienal do Livro do Rio de Janeiro, que estava ocorrendo essa semana, uma polêmica começou após uma mãe comprar a hq "Vingadores: a cruzada das crianças" e postar na internet que estava indignada que um conteúdo "infantil" tivesse uma cena com dois personagens masculinos se beijando.

Bom, eu vou pular as discussões sobre quadrinhos não serem necessariamente uma mídia infantil e o fato de que...bem... qual seria o problema de um beijo gay num quadrinho infantil? O importante foi o que veio depois: o honorável prefeito do Rio, Marcelo Crivella, ordenou que as edições desse quadrinho fossem lacradas e marcadas com um selo de que o conteúdo era improprio para menores usando como base o ECA. O que se seguiu foi um verdadeiro deus nos acuda, na sexta-feira em pouco mais de 40 minutos de Bienal as edições de "Cruzada das crianças" foram dadas como esgotadas e no mesmo dia doze funcionários da prefeitura foram mandados para o evento atrás de material LGBT voltado para o publico infanto-juvenil. As editoras e a própria Bienal se manifestaram de forma contraria ao que estava acontecendo e entre os diversos protestos contra essa atitude a mais significativa foi sem-duvidas a do Felipe Neto (sim, o youtuber). Ele comprou todo o estoque de livros LGBT dos estandes das maiores editoras e os distribuiu gratuitamente no dia de hoje, todos cobertos com um plastico preto e com um aviso de "Este livro é improprio para pessoas atrasadas, retrogradas e preconceituosas".

Aqui a famigerada hq "Vingadores: A cruzada das crianças" que foi ameaçada de censura pelo Marcelo Crivella

E aqui a resposta do Felipe Neto: livros LGBT sendo distribuídos gratuitamente

Acho que esta claro para todos que isto não foi um ato isolado. Estamos sob um governo onde ministros se reúnem com grupos de psicólogos favoráveis a "cura gay" (aqui ), onde o presidente já proferiu inúmeras falas homofóbicas, onde os LGBT são ocultados na medida provisoria sobre a atribuição de direitos humanos (isso logo no primeiro dia de mandato!) (aqui) e onde poucas semanas atrás apostilas que falam sobre questões de gênero foram recolhidas das escolas(aqui)!!! O que aconteceu no Rio de Janeiro é a amostra grátis do que acontecerá no resto do país em maior escala, tanto em termos de repressão quanto em relação a resistência que foi gerada. Precisamos mais do que nunca nos posicionarmos, esse blog é um blog voltado para conteúdo queer e esta é uma das formas com as quais eu irei resistir e me manifestar.

Histórias queer salvam vidas queer, mais do que histórias de ficção, mas também histórias de vida. Histórias que durante muito tempo foram apagadas, arrastadas para baixo do tapete, relegadas ao privado do privado. Histórias de pessoas que podem ter sido conhecidas, cujos nomes vocês provavelmente já ouviram, mas que talvez você não saiba que eram pessoas LGBT, pessoas que muitas vezes não tiveram a chance de viver a sua queerness plenamente. Pessoas como Horace Walpole, William Beckford, Lord Byron, Daphne Du Murier, Oscar Wilde, Matthew Gregory Lewis, Andy Milligan, Patricia Highsmith entre outros. Para compartilhar tais histórias irei começar nesse blog uma série que chamarei de "fear this queer", onde pretendo falar brevemente sobre a vida e obra dessas pessoas. Também procurarei falar sobre escritores contemporâneos como Eric Novello, Caitlín Kiernan e Clive Barker, mais do que nos interessar e admirar aqueles que já se foram, precisamos também apoiar os que produzem nesse momento em que estamos.

Pretendo fazer esses textos pelo menos duas vezes por mês, como estou num momento complicado do meu curso é o máximo que eu posso prometer. Por enquanto é isto. Leiam histórias queer, compartilhem histórias queer, be gay, do crime.